TEMA SAUDE
Bexiga Neurogênica
Lesões ou
doenças do sistema nervoso são causas frequentes de distúrbios
vésico-esfinctéricos, podendo ter um importante impacto na qualidade de
vida dos seus portadores como também determinar o aparecimento de
complicações como infecções do trato urinário (ITU), retenção urinária e
deterioração do trato urinário inferior e superior.
A
avaliação de pacientes com distúrbios miccionais neurogênicos requer um
bom entendimento da fisiologia da micção, bem como das alterações
fisiopatológicas que podem ocorrer em virtude de variadas doenças
neurológicas.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Função Vesicoesfinctérica normal – Neurofisiologia
O trato
urinário inferior (TUI) realiza duas funções básicas:
enchimento/reservatório de urina e esvaziamento. Para que essas funções
possam ocorrer adequadamente, é necessário que ocorra relaxamento da
musculatura lisa vesical (detrusor) e aumento coordenado do tônus
esfinctérico uretral durante a fase de enchimento da bexiga, e o oposto
durante a micção. A coordenação das atividades da bexiga e do esfincter
uretral envolve uma complexa interação entre os sistemas nervosos
(central e periférico) e fatores regulatórios locais, e é mediada por
vários neurotransmissores.
O
funcionamento da bexiga é coordenado em diferentes níveis do sistema
nervoso central, localizados na medula, ponte e centros superiores, por
meio de influências neurológicas excitatórias e inibitórias que se
dirigem aos órgãos do trato urinário inferior e da aferência sensitiva
destes órgãos. Perifericamente, o trato urinário inferior é inervado por
três tipos de fibras: parassimpáticas; simpáticas e somáticas. A
inervação vesical parassimpática origina-se de neurônios localizados na
coluna intermédio-lateral dos segmentos S2 a S4 da medula e é conduzida
pelo nervo pélvico até os gânglios localizados no plexo pélvico. Este se
localiza lateralmente ao reto e origina as fibras parassimpáticas
pós-ganglionares, que se dirigem para a bexiga. A inervação eferente
simpática é originada no segmento toracolombar da medula, de T10 a L2, e
direciona-se, através da cadeia simpática, ao plexo hipogástrico
superior (pré-aórtico). A subdivisão caudal deste plexo forma o nervo
hipogástrico, contendo os eferentes pós-ganglionares simpáticos para a
bexiga e a uretra. A inervação da musculatura estriada do esfincter
uretral é predominantemente somática. Origina-se no núcleo de Onuf,
localizado no corno anterior de um ou mais segmentos da medula espinhal
sacral (S2-S4). Fibras somatomotoras originadas deste núcleo inervam o
esfincter uretral, por meio dos nervos pudendos, sem conexão em gânglios
periféricos. Há evidências de que o esfincter uretral também receba
influência simpática e parassimpática, a partir de ramos dos nervos
hipogástrico e pélvico. Vias aferentes, partindo de receptores
localizados na bexiga e na uretra, são responsáveis pela transmissão de
informações vindas dos referidos órgãos para o sistema nervoso central
(SNC). Dirigem-se para o plexo pélvico, de onde partem para a medula
através dos nervos pélvico, hipogástrico e pudendo. Na medula, fazem
sinapse com neurônios localizados no corno dorsal.
A
atividade dos centros medulares é controlada por centros superiores,
através de tratos descendentes cefalospinais. A micção é coordenada no
tronco encefálico, especificamente na substância pontino-mesencefálica,
denominado centro pontino da micção (CPM), que é a via final comum para
os motoneurônios da bexiga, localizados na medula espinhal. Em
circunstâncias normais, a micção depende de um reflexo
espino-bulbo-espinal liberado pelo CPM. Este recebe influências do
córtex cerebral, cerebelo, gânglios da base, tálamo e hipotálamo
(influências suprapontinas), em sua maior parte inibitórios.
Resumidamente, pode-se descrever o ciclo miccional normal da seguinte forma:
1. Enchimento:
a distensão da bexiga leva à ativação progressiva dos nervos aferentes
vesicais. Esta ativação é acompanhada pela inibição reflexa da bexiga,
via nervo hipogástrico, e estimulação simultânea do esfincter externo
via nervo pudendo. O CPM é continuamente monitorado sobre as condições
de enchimento vesical, mantendo sua influência inibitória sobre o centro
medular sacral, que inerva a bexiga, liberando progressivamente a
ativação do esfincter externo.
2. Esvaziamento:
após alcançar um nível crítico de enchimento vesical e sendo a micção
desejada naquele momento, o CPM interrompe a inibição sobre o centro
sacral da micção (parassimpático), que ativa a contração vesical através
do nervo pélvico. Ao mesmo tempo, a influência inibitória sobre a
bexiga, feita pelo sistema simpático através do nervo hipogástrico, é
interrompida e ocorre simultânea inibição da ativação somática do
esfincter, relaxando o aparelho esfinctérico e garantindo a coordenação
da micção. Pode-se descrever o ciclo miccional normal como um simples
processo de “liga-desliga”, em que, em um primeiro momento, ocorre
inibição dos reflexos da micção (inibição vesical por meio da
estimulação simpática e inibição da estimulação parassimpática) e
ativação dos reflexos de enchimento vesical (estimulação esfinctérica
pudenda). Este mecanismo é alternado para ativação dos reflexos da
micção (estimulação vesical parassimpática) e inibição dos reflexos de
enchimento (inibição da ativação esfinctérica) e as duas fases vão se
alternando seguidamente.
O
conhecimento da neuroanatomia e neurofisiologia envolvida no controle da
micção permitem antecipar quais os tipos de distúrbios miccionais que
podem ocorrer secundários a patologias que acometem diferentes
estruturas do sistema nervoso. O fator mais importante, neste sentido, é
a localização das estruturas afetadas pela neuropatia:
Doenças
acometendo estruturas do SN localizadas acima do tronco cerebral,
geralmente resultam em contrações detrusoras involuntárias, com
coordenação vésico-esfinctérica mantida. Os sintomas associados são
geralmente de aumento da frequência miccional, urgência,
urge-incontinência e noctúria. Raramente há deterioração do trato
urinário inferior ou superior, já que a coordenação vésico-esfinctérica é
preservada e as pressões vesicais são mantidas em níveis baixos. Entre
as patologias neurológicas mais frequentes neste segmento, destacam-se
os acidentes vasculares cerebrais, traumatismos e tumores cerebrais e a
doença de Parkinson.
Nas
doenças que acometem a medula espinhal acima do segmento sacral, o
padrão mais frequente é de hiper-reflexia detrusora com dissinergismo
vésico-esfinctérico. A interrupção da inibição do arco reflexo da micção
associa-se à perda da coordenação do relaxamento esfinctérico, já que o
CPM também está desconectado dos centros medulares da micção. As causas
principais de lesões neste nível são os traumatismos raquimedulares,
esclerose múltipla, mielodisplasia toracolombar (mielomeningocele) e
doenças inflamatórias de diferentes etiologias, como a mielite pelo
HTLV-1 (paraparesia espástica tropical), neuroesquistossomose medular e
outras mielites de origem indeterminada. Nestes pacientes, os sintomas
mais frequentes são incontinência urinária e dificuldade miccional. Na
maioria dos casos, a sensibilidade vesical está abolida ou é
inespecífica. A maioria dos pacientes apresenta elevação da pressão
detrusora pela hiper-reflexia associada ao dissinergismo. O resíduo
miccional também é elevado. Muitos podem evoluir com perda da
complacência vesical e ITU de repetição. A associação de elevadas
pressões vesicais e ITU de repetição, se não tratada, leva à
deterioração progressiva da bexiga e do trato urinário superior, podendo
ultimamente determinar a falência renal.
Nas
lesões medulares acometendo segmentos abaixo de S2, a arreflexia
detrusora é o padrão mais frequente, uma vez que o centro parassimpático
da micção é lesado. O mecanismo esfinctérico pode ser afetado de várias
maneiras, mas geralmente mantém um tônus moderado. Os pacientes com
lesões neste nível geralmente apresentam sintomas de dificuldade
miccional associados a perda total ou parcial da sensibilidade vesical.
Podem apresentar incontinência por transbordamento. Por vezes, pode
haver lesão predominante do núcleo de Onuf, responsável pela inervação
do rabdoesfincter uretral. Nestas circunstâncias, pode ocorrer
deficiência esfinctérica. As patologias que mais frequentemente acometem
este segmento da medula são os TRM e as mielodisplasias, como a
mielomeningocele lombossacral e as malformações sacrais.
As lesões que acometem estruturas periféricas podem
ser bastante semelhantes às lesões dos segmentos medulares sacrais
inferiores. Frequentemente, entretanto, o tônus esfinctérico pode ser
muito baixo, podendo ocorrer deficiência esfinctérica severa. São
causadas por traumatismos pélvicos severos e cirurgias pélvicas
radicais, como amputação de reto e cirurgia de Wertheim-Meiggs.
Não é
possível prever com exatidão o padrão de disfunção vésico-esfinctérica
de um paciente com base exclusivamente no conhecimento do nível da lesão
neurológica.
A fase da
lesão também deve ser considerada na avaliação e no tratamento de
algumas patologias neurológicas. No TRM agudo, há uma fase inicial de
choque medular, com duração de dias a semanas, onde ocorre padrão de
arreflexia detrusora. De forma semelhante, pacientes com AVC podem
apresentar retenção urinária nos primeiros dias da lesão devido a uma
fase transitória de arreflexia detrusora.
Classificação das Disfunções Miccionais Neurogênicas
Várias
classificações foram propostas para descrever os padrões miccionais
causados por lesões neurológicas. Atualmente, a classificação funcional
proposta por Wein e Barret (1988) é a que tem recebido maior aceitação
entre os especialistas e é a mais recomendada. Pode ser utilizada para
pacientes com distúrbios miccionais de qualquer origem, não
necessariamente neurogênicos. Classifica os distúrbios em problemas do
enchimento vesical, do esvaziamento ou combinado (Tabela 1).
Tabela 1: Classificação funcional expandida das disfunções miccionais neurogênicas
Falha de armazenamento
|
Falha de esvaziamento
|
Causa
vesical: hiperatividade (contrações involuntárias do detrusor), doença
ou lesão neurológica, inflamação, idiopática, obstrução infravesical,
déficit de complacência, doença ou lesão neurológica, fibrótica,
hipersensibilidade, inflamatória/infecciosa, neurológica, psicológica
|
Causa vesical: neurológica, miogênica, psicogênica, idiopática
|
Causa
infravesical: incontinência urinária de esforço genuína, falha de
suporte suburetral, relaxamento do assoalho pélvico, hipermobilidade
vésico-uretral, deficiência esfinctérica intrínseca, doença ou lesão
neurológica, fibrótica, mista
|
Causa
infravesical: anatômica, obstrução prostática, estenose do colo vesical,
estenose uretral, compressão uretral, funcional, dissinergia do
esfincter estriado, dissinergia do esfincter liso, mista
|
ACHADOS CLÍNICOS
Pacientes
com doenças neurológicas podem apresentar-se com graus variados de
deficiência mental e física, de tal forma que a abordagem de cada
paciente deve ser individualizada. Nesta população, a severidade das
co-morbidades e o status funcional são fundamentais para a definição da
abrangência da investigação clínica e para o estabelecimento de metas de
tratamento.
A
avaliação clínica detalhada é a principal parte da investigação médica
de pacientes apresentando-se com suspeita de distúrbios miccionais
neurogênicos. Ela precisa caracterizar os sintomas miccionais, assim
como o estado geral de saúde do paciente, sua saúde mental, história
prévia de tratamentos urológicos e o impacto dos sintomas urinários
sobre a qualidade de vida. O exame físico é fundamental para avaliar a
presença de globo vesical, características da próstata, anormalidades
genitais e da região sacral, prolapsos vaginais e déficits neurológicos.
A partir desta avaliação, deve ser possível realizar um diagnóstico
presuntivo e o direcionamento dos exames complementares, além da
instituição de medidas terapêuticas iniciais.
A
avaliação urológica deve incluir exames laboratoriais para pesquisa de
ITU, hematúria e função renal, incluindo urina I, cultura e urocultura.
Nos pacientes com micção espontânea, a medida do fluxo e resíduo são
fundamentais. Idealmente, um diário miccional de 2 a 3
dias deve ser obtido para ajudar a caracterizar o padrão habitual de
ingestão de líquidos, frequência miccional e severidade da incontinência
(quando presente).
A
avaliação radiológica deve ser individualizada podendo incluir uma
simples ultra-sonografia de vias urinárias ou requerer uretrocistografia
miccional/retrógrada (UCM/R), urografia intravenosa (UIV), estudos
radioisotópicos ou tomografia computadorizada. Pacientes com bexiga
neurogênica estão mais propensos a desenvolver diversas complicações do
trato urinário como estenose uretral, refluxo vesicoureteral, litíase e
deterioração do trato urinário. Como regra, pacientes com lesões
neurológicas graves devem sempre realizar ultra-sonografia do aparelho
urinário e uretrocistografia ao menos na investigação inicial.
EXAMES COMPLEMENTARES
Exames Urodinâmicos
Enquanto a
indicação dos exames urodinâmicos em mulheres com incontinência
urinária ou homens com LUTS é controversa, a maioria dos especialistas
concorda com a sua realização liberal no diagnóstico e acompanhamento de
pacientes com sintomas miccionais associados a doenças neurológicas.
Além
disso, durante o curso da doença, alterações vesicais podem ocorrer,
mudando o padrão miccional. Os exames urodinâmicos permitem identificar o
tipo específico de disfunção miccional em cada paciente, possibilitando
a instituição de tratamento apropriado. Outra importante utilidade dos
exames urodinâmicos é a de identificar pacientes de risco para
desenvolver complicações urológicas, permitindo intervenção precoce
nestes pacientes.
Na urodinâmica, avalia-se a função de reservatório da bexiga e seu esvaziamento.
TRATAMENTO
O
tratamento dos distúrbios miccionais neurogênicos segue princípios que
se aplicam ao tratamento de outros pacientes com queixas urológicas.
Deve-se levar em consideração a possibilidade de reversão da doença
neurológica que, quando possível, deve ser prioridade. Algumas causas
possivelmente reversíveis são a compressão da cauda equina por hérnia de
disco ou tumores e as doenças infecciosas ou inflamatórias do SNC
(neuroesquistossomose, cisticercose).
Os objetivos do tratamento incluem:
· preservar ou recuperar o TUS;
· minimizar os episódios de ITU;
· permitir enchimento vesical com baixa pressão;
· permitir esvaziamento vesical completo e com baixa pressão;
· manter a continência urinária.
Estes
objetivos devem ser obtidos preferencialmente sem o uso de cateteres,
por meio de medidas bem aceitas pelo paciente e seus familiares. O
programa de tratamento deve ser flexível, levando em consideração a
vontade do paciente e seus familiares e a aplicabilidade de cada medida
para cada paciente.
Aspectos
como o prognóstico da doença neurológica, reversibilidade do tratamento,
seus efeitos adversos, frequência e abrangência do seguimento
urológico, melhor e pior evoluções clínicas possíveis em cada
alternativa e métodos alternativos devem ser discutidos.
O
tratamento deve sempre ser iniciado pelas medidas mais simples,
reversíveis e com menos efeitos colaterais que possam atingir os
objetivos do tratamento, procedendo gradualmente para procedimentos de
maior complexidade e riscos.
Tratamentos para Melhorar o Enchimento Vesical
Os
distúrbios miccionais neurogênicos frequentemente acompanham-se de
anormalidades na fase de enchimento vesical, principalmente pela
presença de hiperatividade detrusora, mas também podendo haver
comprometimento da complacência vesical e da competência do mecanismo
esfinctérico. As modalidades de tratamento para facilitar o enchimento
vesical podem ser aplicadas de forma isolada ou conjuntamente nos
pacientes com distúrbios miccionais neurogênicos.
Tratamento Comportamental
Esta
categoria inclui diversos métodos e ações, que visam resgatar o controle
vesical, aumentando a capacidade efetiva da bexiga. Não existe um
protocolo único ou padronizado que seja seguido por todos os que aplicam
os diferentes métodos de terapia comportamental. A educação do paciente
é o elemento central dos tratamentos comportamentais. Este método tem
aplicação limitada em pacientes com déficits cognitivos ou motores que
impeçam sua compreensão ou execução das medidas.
Entre os métodos mais usados de tratamento comportamental destacam-se:
· adequação da ingestão de líquidos;
· treinamento vesical;
· fisioterapia pélvica;
· micção de horário, ou comandada para pacientes com deficiências físicas ou cognitivas;
· evitar potenciais irritantes vesicais (cafeína, refrigerantes, álcool etc.).
O diário
miccional tem um papel importante no tratamento, mantendo os pacientes
envolvidos diretamente no seu tratamento e permitindo avaliar o volume
urinado e identificar os que precisam restringir a ingestão de líquidos.
O uso de
terapias enfocando o assoalho pélvico é também parte importante do
protocolo de tratamento comportamental proposto por diferentes autores. A
contração da musculatura do assoalho pélvico (exercícios de Kegel) é
usada pelos pacientes para inibir uma contração vesical inicial ou
iminente. O mecanismo de funcionamento baseia-se na inibição fisiológica
do arco reflexo miccional promovida pela contração do esfincter
estriado da uretra. Muitas vezes, os pacientes são incapazes de isolar e
contrair eficientemente a musculatura pélvica. Nestas circunstâncias, o
biofeedback e a estimulação elétrica podem ser muito úteis como medidas
auxiliares, capacitando os pacientes a localizar e utilizar a
musculatura do assoalho pélvico de maneira eficiente.
Os
resultados do tratamento comportamental são bastante satisfatórios em
pacientes sem déficits motores e sensitivos severos. São, de maneira
geral, simples, baratos, eficientes e isentos de efeitos colaterais.
Tratamento Farmacológico
A maioria
das drogas neste grupo destina-se ao tratamento da hiperatividade
detrusora. Vale ressaltar que muitos pacientes com diagnóstico de
déficit de complacência podem apresentar um componente de hiperatividade
detrusora associado (contrações tônicas) e, por esta razão, podem se
beneficiar do tratamento farmacológico.
Embora
diversos neurotransmissores possam ser alvos do tratamento farmacológico
dos distúrbios da micção, sabe-se que a contração das fibras musculares
lisas da bexiga é mediada predominantemente pela estimulação
colinérgica de receptores muscarínicos pós-ganglionares. Cinco subtipos
de receptores muscarínicos foram identificados, sendo denominados M1 a
M5. Na bexiga humana e de vários outros mamíferos, predominam os
subtipos M2 e M3, sendo que os receptores M3 são os principais
responsáveis pela contração vesical. Portanto, drogas que possam
bloquear estes receptores são mais eficientes em reduzir a
hiperatividade detrusora.
Uma vez
que a estimulação colinérgica muscarínica é o principal mecanismo de
contração vesical em humanos, drogas antimuscarínicas são a principal
alternativa farmacológica para o tratamento da hiperatividade detrusora.
De acordo com a Agência Americana de Política de Saúde e Pesquisa
(AHCPR) e o Consenso Brasileiro de Incontinência Urinária, os
anticolinérgicos são os agentes farmacológicos de primeira escolha para o
tratamento desta condição clínica. Entretanto, como os receptores
muscarínicos M2 e M3 estão presentes no organismo em diversos outros
órgãos além da bexiga (como as glândulas salivares, trato intestinal,
coração e olhos), drogas que atuam nestes receptores podem afetar a
função destes órgãos, explicando dois dos mais frequentes efeitos
colaterais resultantes do uso de drogas antimuscarínicas: boca seca e
constipação.
A
oxibutinina é o agente antimuscarínico mais usado no tratamento da
hiperatividade detrusora e tem sua eficácia clínica bem documentada. É
um potente antagonista de receptores muscarínicos, com discreta
seletividade para receptores M3 e M1 em relação aos outros subtipos.
Aparentemente, possui também uma ação espasmolítica direta sobre o
detrusor, provavelmente mediada por antagonismo ao Ca2+ e uma
ação anestésica local. Acompanham-se frequentemente de efeitos
antimuscarínicos adversos, particularmente boca seca, e também
constipação, visão turva e sonolência, levando à interrupção do
tratamento ou diminuição da dose para um nível de menor eficácia
terapêutica. Com o intuito de aumentar a tolerabilidade da oxibutinina,
diversas novas táticas têm sido propostas, como a administração
intravesical ou intra-retal da droga, pílulas de liberação prolongada e
uso concomitante de estimuladores da salivação.
A
tolterodina é um potente antagonista competitivo de receptores
muscarínicos na musculatura lisa detrusora. Embora não possua
especificidade para nenhum dos cinco subtipos de receptores
muscarínicos, estudos demonstraram seletividade para a bexiga em relação
às glândulas salivares, o que pode diminuir a incidência de efeitos
colaterais. Sua eficácia clínica e tolerabilidade foram avaliadas em
diversos estudos controlados, que demonstraram eficácia semelhante à da
oxibutinina, com menor incidência de efeitos colaterais.
Outras
drogas anticolinérgicas ou com mecanismos de ação mistos, como
darifenacina, brometo de propantelina, brometo de emeprônio, cloreto de
trospium, diciclomina, propiverina e flavoxato, foram e/ou continuam
sendo utilizadas com sucesso variável no tratamento da HD. Devido aos
seus efeitos colaterais e menor eficácia, ou por não terem sido
estudados suficientemente, são pouco utilizados na prática clínica.
Alguns não estão disponíveis no Brasil.
Outras Opções no Tratamento Farmacológico da Hiperatividade Detrusora
Os
conhecidos efeitos colaterais das drogas antimuscarínicas têm promovido
interesse em alternativas farmacológicas para o tratamento da
hiperatividade detrusora. Diversas áreas do SNC estão envolvidas no
controle da micção, incluindo estruturas supramedulares (córtex,
diencéfalo, ponte) e medulares. Neurotransmissores como glutamato,
serotonina, noradrenalina, dopamina e o ácido gama-aminobutírico (GABA)
atuam no SNC e possuem ação inibitória ou excitatória no controle da
micção, podendo ser alvos de tratamento farmacológico. Entretanto, eles
estão envolvidos em muitas outras funções do SNC, e drogas que atuem nos
seus receptores podem afetar outros sistemas. Embora representem uma
importante área de pesquisa farmacológica para os distúrbios da micção,
ainda não foram desenvolvidas drogas com atuação no SNC que apresentem
eficácia e segurança clínica no tratamento da hiperatividade vesical.
Sabe-se
que os receptores alfa-adrenérgicos localizados no detrusor estão
envolvidos no relaxamento da musculatura lisa vesical. A possibilidade
de usar agonistas beta-3-adrenérgicos no tratamento da HD é muito
promissora, mas sua eficácia e segurança ainda precisam ser demonstradas
em estudos clínicos controlados.
Drogas que agem no canais de K+,
como a cromacalina e o pinacidil, demonstraram efeito inibitório sobre
as contrações detrusoras em animais, mas os estudos clínicos não foram
animadores, pois estas drogas possuem efeito mais potente sobre a
musculatura lisa dos vasos sanguíneos e os níveis requeridos para
inibição da bexiga causam elevada frequência de efeitos colaterais.
Novas drogas estão em investigação e parecem apresentar maior
especificidade para a musculatura lisa da bexiga.
Os
antidepressivos tricíclicos são muito utilizados no tratamento da HD. O
mecanismo de ação destas drogas é complexo e parece incluir efeitos
sedativos e anticolinérgicos sobre o SNC, atividade anticolinérgica
periférica e bloqueio da recaptação de neurotransmissores, como a
serotonina e a noradrenalina. A imipramina é a principal droga dentro
desta categoria no tratamento da HD. Embora tenha efeitos
anticolinérgicos sistêmicos pronunciados, sua ação antimuscarínica
direta sobre o detrusor é pequena. Exerce, entretanto, um efeito
inibitório direto sobre o detrusor cujo mecanismo não é conhecido.
Clinicamente, alguns estudos demonstraram bons resultados com a
imipramina no tratamento da HD.
Bloqueio da Aferência Vesical
Uma opção
no tratamento da HD é o uso intravesical de drogas bloqueadoras da
aferência da bexiga. As duas principais drogas neste grupo são a
capsaicina e a resiniferatoxina.
A
capsaicina é uma neurotoxina extraída de pimentas vermelhas que exerce
um efeito bifásico nos nervos sensitivos, inicialmente causando sua
excitação e, em seguida, determinando um período prolongado de bloqueio
com resistência à ativação por estímulos habituais. As fibras C e
possivelmente também as fibras Ad são bloqueadas com o uso intravesical
da capsaicina. Diversos estudos clínicos foram conduzidos em pacientes
com HD causada por lesão medular e demonstraram melhora clínica e
urodinâmica com o uso da capsaicina. Observou-se, entretanto, uma
incidência importante de efeitos colaterais, como dor suprapúbica,
urgência miccional, hematúria e disreflexia autonômica.
A
resiniferatoxina é um análogo da capsaicina muito mais potente que esta
na dessensibilização da aferência vesical, mas com menor potencial de
produzir inflamação da bexiga. Assim, apresenta eficácia semelhante, mas
com efeitos colaterais menos intensos. A duração dos efeitos destas
drogas varia de 2 a 7 meses, requerendo nova aplicação após este período.
Toxina Botulínica no Tratamento da Hiperatividade Detrusora
Uma
alternativa nova e bastante promissora no tratamento da hiperatividade
detrusora é a injeção de toxina botulínica, por via endoscópica, na
musculatura lisa vesical (detrusor). A toxina botulínica é a neurotoxina
mais potente conhecida e tem sido utilizada clinicamente desde a década
de 1970. Ela bloqueia seletivamente a liberação da acetilcolina pelas terminações nervosas por meio da inibição do transporte das vesículas pré-sinápticas, causando desnervação funcional que pode durar até 6 a 9 meses.
O
conhecimento do exato mecanismo de ação da toxina botulínica e o
espectro de doenças capazes de serem tratadas com esta droga têm
aumentado progressivamente. Vários estudos demonstraram sua eficácia no tratamento de variadas
condições clínicas como cefaléias tensionais, síndromes dolorosas
miofasciais, distonia, espasticidade, acalasia de esôfago e hiperidrose.
Na urologia, a toxina botulínica tem sido usada com sucesso no
tratamento da dissinergia vésico-esfinctérica. Estudos preliminares
indicam que a injeção da toxina botulínica na musculatura lisa vesical
bloqueia a transmissão nervosa parassimpática na bexiga e determina
importante melhora clínica em pacientes com hiperatividade detrusora.
Resultados
do tratamento da hiperatividade detrusora com injeção endoscópica de
toxina botulínica mostram que a capacidade vesical aumenta
significativamente e a pressão detrusora máxima é reduzida, com mínimos
efeitos colaterais e com efeitos sobre a bexiga mantendo-se por6 a 9 meses.
Tratamentos Invasivos
O uso de
técnicas invasivas de neuromodulação e/ou de procedimentos cirúrgicos no
tratamento da HD, como ampliação ou desnervação vesical, é geralmente
reservado para pacientes com hiperatividade detrusora severa,
notadamente aqueles com patologias medulares como traumatismo
raquimedular e mielomeningocele. Entre os indivíduos sem doença
neurológica, só devem ser considerados naqueles com sintomas muito
severos e que tenham sido submetidos a múltiplos tratamentos
conservadores sem sucesso.
As
técnicas de neuromodulação podem ser utilizadas tanto para o tratamento
da HD como para promover o esvaziamento vesical. O tratamento da HD
baseia-se na estimulação das raízes aferentes de S2-S4 pela implantação
de um eletrodo que é conectado a um gerador de pulsos. Este transmite
continuamente impulsos de baixa intensidade para as raízes referidas,
resultando em aumento reflexo da estimulação simpática sobre a bexiga e
inibição da atividade parassimpática sobre ela, inibindo o reflexo da
micção. Antes da implantação definitiva do eletrodo e do gerador de
pulsos, o paciente é submetido a um teste com eletrodos percutâneos e a
resposta clínica é avaliada. Diversos estudos demonstraram bons
resultados com a neuromodulação em pacientes com HD refratária ao
tratamento farmacológico. Os altos custos do tratamento, sua
invasividade e potenciais complicações como dor, migração do eletrodo,
infecções e mau funcionamento do aparelho contribuem para que esta
modalidade permaneça como alternativa para casos selecionados de
pacientes com HD.
As
técnicas de desnervação são alternativas para o tratamento da HD
refratária. Podem ser feitas em diferentes níveis (nervos sacrais,
nervos pélvicos ou na própria bexiga) e por meio de métodos variados
como injeção de substâncias neurotóxicas, interrupção cirúrgica das
estruturas nervosas ou lesão das mesmas por fontes de energia como a
radiofrequência. Entre as muitas técnicas de desnervação propostas, a
rizotomia sacral posterior é a mais eficiente no tratamento da HD
refratária, mas só é utilizada em pacientes com lesões medulares
completas. Visa interromper completamente a aferência vesical, abolindo o
arco reflexo da micção e tornando a bexiga arreflexa. Vários autores
relataram bons resultados com esta técnica de desnervação vesical no
tratamento da HD.
As
cirurgias de ampliação vesical têm sido utilizadas em pacientes com HD
severa e com comprometimento da capacidade e complacência vesicais. A
maior parte dos candidatos a estas cirurgias é portadora de patologias
medulares como traumatismo raquimedular e mielomeningocele. A maioria
das cirurgias de ampliação é feita com uso de segmentos intestinais,
notadamente o íleo e o cólon. Ambos apresentam bons resultados, mas uma
taxa significativa de complicações a curto e longo prazo, limitando sua
indicação aos pacientes que não obtiveram melhora com métodos menos
invasivos. Por causa dos riscos de complicações, métodos alternativos de
ampliação como a auto-ampliação, o uso do ureter ou de segmentos
intestinais desepitelisados e técnicas de engenharia de tecidos vêm
sendo utilizados ou estão em desenvolvimento. Apesar destes
avanços significativos, cada um destes métodos possui limitações, e a
ampliação com segmentos intestinais permanece sendo a alternativa mais
eficiente para a ampliação vesical.
Tratamentos para Aumentar a Resistência Uretral
O
comprometimento do mecanismo esfinctérico do trato urinário inferior
pode decorrer de distúrbios em um ou mais dos seus componentes:
· inervação do esfincter e assoalho pélvico;
· propriedades estruturais do músculo liso e/ou estriado esfinctéricos;
· elementos intrínsecos da uretra;
· estruturas do assoalho pélvico.
Tais
alterações podem ocorrer em decorrência de processos degenerativos,
traumatismos externos ou iatrogênicos, bem como de patologias
neurológicas ou musculares.
As
alternativas medicamentosas para aumento da resistência uretral são
poucas e de eficiência bastante limitada. Os agonistas alfa-adrenérgicos
são o principal representante. Sua ação concentra-se principalmente
sobre as fibras musculares lisas do colo vesical que possuem alta
concentração de receptores alfa-adrenérgicos. Quando estimulados, tais
receptores promovem a contração destas fibras musculares e determinam um
aumento da resistência uretral. Existem vários agentes neste grupo,
porém, como não se trata de drogas com ação específica sobre o trato
urinário, a sua administração frequentemente associa-se a efeitos
colaterais como aumento da pressão arterial, ansiedade, insônia,
cefaléia, fraqueza, taquicardia e outras arritmias cardíacas, devendo
ser evitadas em pacientes com patologias cardiocirculatórias e em idosos. Aefedrina e a fenilpropanolamina (norefedrina) são as principais drogas nesta categoria.
Entre os
pacientes com distúrbios neurogênicos, os tratamentos farmacológicos
para aumento da resistência uretral são raramente utilizados. As
condições neurológicas que costumam reduzir a ação do mecanismo
esfinctérico uretral são principalmente as doenças que afetam os
segmentos sacrais (S2-4, onde se localiza o núcleo de Onuf) ou os nervos
periféricos para o esfincter uretral (pudendo), como os disrafismos da
coluna (mielomeningocele), os TRM baixos e as lesões periféricas
causadas por cirurgias pélvicas radicais. Tipicamente, os tratamentos
mais aplicados e que se acompanham de melhores resultados nestes
pacientes são a implantação do esfincter artificial, a injeção de
substâncias como colágeno ou silicone no colo vesical e as cirurgias de
Sling para pacientes do sexo feminino (nestes casos, faz-se Sling
obstrutivo, com o objetivo de tornar a paciente retencionista). Em todos
estes casos, existe uma grande chance de que o paciente passe a
necessitar de cateterismo intermitente.
Tratamentos para Melhorar o Esvaziamento Vesical
A melhora
do esvaziamento vesical de pacientes com distúrbios neurogênicos é
frequentemente um dos maiores desafios para o urologista. Há poucas
alternativas farmacológicas que geralmente mostram-se pouco eficientes. Neste
sentido, um avanço importante foi a introdução do cateterismo
intermitente. É utilizado atualmente como forma de esvaziamento vesical
em diversas condições urológicas, não somente de causa neurológica. Esta
técnica contribuiu muito para diminuir a morbidade associada ao uso
crônico de cateteres uretrais, além de melhorar a qualidade de vida dos
pacientes.
Falência da Contração Vesical
A
incapacidade de gerar uma contração detrusora eficiente tem óbvias
implicações sobre a fisiologia da micção. Um dos principais aspectos
necessários para o esvaziamento vesical adequado é a capacidade vesical
de gerar uma contração eficiente. Quando esta não ocorre, a micção é
ineficiente e ocorrem sintomas como jato fraco e intermitente,
necessidade de uso de prensa abdominal e sensação de esvaziamento
vesical incompleto. Outros sintomas, como aumento da frequência urinária
e incontinência urinária por transbordamento, podem ocorrer em virtude
da incapacidade da bexiga esvaziar-se. O quadro clínico dos pacientes
com contratilidade vesical diminuída pode acompanhar-se de infecções
urinárias de repetição, litíase vesical e outras complicações
progressivas como fibrose vesical, refluxo vesicoureteral e
comprometimento do trato urinário superior.
Alternativas Terapêuticas para Tratar Problemas da Contração Vesical
1. Compressão externa e/ou manobra de Valsalva
As
manobras de Credé (compressão manual externa) e Valsalva (uso de prensa
abdominal) podem ser eficientes em pacientes capazes de gerar uma
pressão abdominal significativamente elevada (acima de 50 cmH2O)
e que possuam resistência uretral diminuída. É um mecanismo
não-fisiológico de micção que sofre a resistência das mesmas forças que
fisiologicamente impedem as perdas urinárias aos esforços. O
afunilamento fisiológico do colo vesical durante a micção não ocorre com
as manobras de esforço e pode haver aumento na resistência uretral na
vigência de manobras de elevação da pressão abdominal. Assim, os
pacientes que têm mais chances de se beneficiar desta forma de
tratamento são os que possuem algum grau de incontinência urinária e
comprometimento esfinctérico associado à falência da contração vesical.
2. Tratamento farmacológico
Pouca ou
nenhuma melhora clínica pode ser obtida com os tratamentos
farmacológicos disponíveis atualmente. Drogas que imitam a ação da
acetilcolina poderiam ser eficientes no tratamento de pacientes com
diminuição da contratilidade vesical, uma vez que o maior estímulo
farmacológico para a contração detrusora é promovido pela ativação de
receptores colinérgicos muscarínicos da membrana celular. A acetilcolina
não pode ser usada clinicamente devido às suas ações no sistema nervoso
central e nos gânglios do sistema nervoso periférico e também porque é
rapidamente hidrolisada no organismo. Existem inúmeras drogas
parassimpatomiméticas, mas apenas o cloreto de betanecol apresenta um
perfil farmacológico de relativa seletividade para o trato urinário, com
mínima ação sobre receptores nicotínicos e pouco suscetíveis à
colinesterase. Sua ação estimuladora da contratilidade vesical já foi
demonstrada in vitro em vários estudos. Embora seja usada
clinicamente para melhorar a contratilidade vesical, não há evidências
clínicas suficientes para recomendar seu uso. Além disso, efeitos
colaterais possíveis incluem náuseas, vômitos, diarréia, cefaléia,
aumento da salivação e sudorese.
3. Cateterismo vesical intermitente
O
tratamento atual de escolha para a maioria dos pacientes com falência da
contração vesical de qualquer etiologia é o cateterismo vesical
intermitente. Apesar
dos grandes benefícios que confere aos pacientes, o cateterismo
intermitente acompanha-se de vários inconvenientes e riscos, como:
· possibilidade de infecção urinária;
· possibilidade de lesão uretral, vesical ou litíase;
· necessidade de que o paciente tenha sempre cateter uretral e outros materiais necessários ao cateterismo;
· maior gasto de tempo para realizar as micções (que são bem mais demoradas através do CIL);
· piora
da auto-estima e imagem corpórea ou outros distúrbios psicológicos
relacionados com a necessidade de utilizar o cateter uretral;
· dor ou desconforto para a passagem do cateter nos pacientes sem alteração da sensibilidade uretral;
· necessidade
de ajuda para realizar o cateterismo nos pacientes com limitações
motoras e/ou cognitivas. Desta forma, embora a maioria dos pacientes
aprenda facilmente a realizar o CIL, sua aceitação não é boa entre todos
os pacientes, que manifestam constantes interesse em alternativas
terapêuticas que possam oferecer a possibilidade de recuperar o
esvaziamento vesical espontâneo.
4. Drogas que reduzem a resistência uretral
Diferentemente
de outras áreas da bexiga, o colo vesical e a musculatura lisa
prostática possuem rica inervação alfa-adrenérgica que promove contração
de suas fibras. Desta forma, a utilização de alfabloqueadores pode
promover relaxamento da musculatura lisa a este nível, reduzindo a
resistência ao fluxo urinário. Isto pode ser útil no tratamento de
pacientes portadores de dificuldade de esvaziamento tanto por uma
hiperatividade do colo vesical (como a que ocorre em certos tipos de
lesão medular – dissinergia de esfincter interno) como em portadores de
hiperplasia prostática benigna. Contudo, estas drogas são muito pouco
úteis em portadores de distúrbios neurogênicos, notadamente naqueles com
dissinergismo vésico-esfinctérico.
Alternativas Terapêuticas para Tratar Problemas do Dissinergismo
Tratamentos Cirúrgicos
Os
tratamentos nesta categoria visam principalmente tratar a hipertonia do
esfincter externo, responsável pelas altas pressões vesicais e seus
efeitos deletérios sobre a bexiga e o TUS. Incluem-se nesta categoria a
esfincterotomia, o uso de stents uretrais para bypass do esfincter
externo, a dilatação do esfincter com balão uretral e as cirurgias de
desnervação do esfincter, com interrupção do nervo pudendo. Todas elas
visam reduzir ao máximo a resistência uretral, tornando o paciente
incontinente e requerendo o uso de um coletor externo. Desta maneira,
não são utilizadas em pacientes do sexo feminino. Nestas e nos pacientes
do sexo masculino cuja uretra não é uma boa alternativa de cateterismo
(por estenose severa, fístula etc.), as derivações continentes podem ser
uma excelente alternativa, realizando-se o cateterismo intermitente
pelo estoma.
Um novo
tratamento que está em fase de testes é o uso da toxina botulínica no
esfíncter externo. Sua ação causa uma paralisia da musculatura estriada e
uma diminuição da hipertonia esfinctérica, possibilitando ao paciente
que urine espontaneamente. Um outro uso para a toxina botulínica no
esfíncter é para pacientes que apresentam arreflexia detrusora e que
fazem uso de cateterismo intermitente limpo. Após a aplicação da toxina
no esfincter, o paciente passa a urinar alguns dias após com manobras de
Credé ou Valsalva, sendo possível a retirada do cateterismo
intermitente limpo. Esse procedimento pode deixar o paciente
incontinente após a aplicação, mas estudos mostraram que casos de
incontinência são muito raros, que essa é uma técnica promissora e que,
no futuro próximo, fará parte dos recursos para tratar esse tipo de
problema